De todo o Brasil realizarão as provas do SAEB (Sistema de Avaliação da Educação Básica) 2025, avaliação que ocupa lugar central nas políticas educacionais brasileiras e é apresentado como um dos principais instrumentos de diagnóstico da qualidade do ensino no Brasil, produzindo dados que servem de base para o cálculo do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) e orientando estratégias de políticas e gestão escolar. No entanto, por trás da aparência técnica e objetiva, o SAEB acaba mascarando falhas profundas nos processos de ensino e aprendizagem, funcionando mais como uma ferramenta de marketing educacional do que como um instrumento de transformação real da educação.
Apesar de seus resultados serem amplamente divulgados e utilizados para medir o desempenho das redes de ensino, orientar políticas públicas e ranquear escolas, um exame mais atento revela que esse instrumento, além de suas aparências técnicas, pode funcionar como um artifício que disfarça as falhas estruturais do sistema de ensino, funcionando mais como maquiagem estatística do que como alavanca de transformação efetiva. Podemos dizer que o SAEB, em sua forma atual, tende a mascarar fraquezas no processo educacional, por transformar em ranking aquilo que deveria ser instrumento de diagnóstico profundo. Para sustentar essa ideia, articulemos argumentos com suporte teórico e empírico.
Em primeiro lugar, o SAEB reduz a complexidade do ato de aprender a números e médias padronizadas. Ao avaliar o desempenho dos alunos com base em testes de múltipla escolha, o sistema ignora dimensões essenciais da formação humana, como o pensamento crítico, a criatividade, a capacidade de argumentação e o domínio da escrita. Assim, o que se mede não é a aprendizagem em sua plenitude, mas a habilidade de responder corretamente a questões padronizadas. Essa lógica transforma o ensino em um treinamento para provas, e não em um processo de construção do conhecimento. De fato, autores que discutem a tensão entre avaliação e qualidade da educação alertam que “a avaliação externa somativa tradicional pode deixar de captar elementos centrais da qualidade escolar, como o engajamento, a autonomia e a criatividade”.
Outro ponto problemático é o uso político dos resultados. Governos, redes de ensino e escolas frequentemente utilizam as notas do SAEB para exibir avanços que, na prática, não correspondem a melhorias efetivas na sala de aula. Do primeiro para o segundo simulado deste ano, muitos alunos e turmas tiveram uma considerável queda em descritores fundamentais de língua portuguesa e de matemática, mas vale ressaltar que isso não é culpa única e exclusivamente dos professores e das instituições de ensino, mas também dos estudantes, pois muitos não estão levando a sério o processo de aprendizagem, não se dedicam aos estudos e não se interessam pelas aulas, mesmo as mais dinâmicas e envolventes, culminando em notas e médias baixas e prejuízos intelectuais.
Assim, para tentar “solucionar” problemas permanentes, sob pressão dos Núcleos Regionais de Educação, faltando cerca de um mês para as provas as escolas estão desenvolvendo atividades intensivas com os alunos-alvo com revisões e recomposições de conteúdos, com o intuito de obterem resultados melhores nas respectivas avaliações. Acontece que não apenas os professores estão sendo pressionados, mas também os estudantes, onde o “futuro” das suas escolas está em “suas mãos”. O trabalho com revisões e recomposições de conteúdos sem dúvidas é importantes, porém tem-se melhores resultados se for contínuo e permanente, e não somente em anos ímpares (anos de SAEB) ou, pior ainda, mais intensamente há um mês das avaliações. O resultado é uma maquiagem estatística: números que sobem, mas salas de aula que continuam enfrentando os mesmos desafios.
Por fim, o discurso de eficiência do SAEB contribui para desresponsabilizar o Estado e individualizar a culpa pelo fracasso escolar para os professores (principalmente de língua portuguesa e de matemática) e a escola. O aluno que não aprende é visto como alguém que “não se esforçou”, e o professor, como aquele que “não ensina direito”. Fica de fora a reflexão sobre o contexto socioeconômico, a formação dos docentes e a ausência de políticas de valorização e infraestrutura escolar (infraestrutura, sim, pois muitos alunos estudam em salas de aulas divididas com chapas de compensado ou compartilhadas com outras turmas). A avaliação, assim, deixa de ser um instrumento de diagnóstico para se tornar um mecanismo de controle e punição.
Portanto, o SAEB, ao invés de ser uma ferramenta de aprimoramento do ensino, atua como um espelho embaçado que reflete apenas o que se quer ver. Ele oferece uma ilusão de progresso e eficiência, enquanto esconde as verdadeiras feridas da educação pública brasileira. Para que a avaliação cumpra um papel transformador, é preciso repensá-la em sua essência, incorporando dimensões qualitativas, respeitando as diversidades regionais e, sobretudo, comprometendo-se com a realidade concreta das escolas. Caso contrário, continuará sendo apenas um sistema que maquia, com verniz estatístico, as profundas falhas de nosso processo educativo.
Diego Argenta, professor de Língua Portuguesa e Oratória. Pós-graduado em Comunicação e Oratória; Metodologia do Ensino de Língua Portuguesa e Literatura; Neuropsicopedagogia e Letras e Artes. Mestre de Cerimônias com mais de 20 anos de experiência. Formando em Jornalismo e Sociologia. E-mail: diegoargentavox@gmail.com. Instagram: @diegoargenta.mc.