A condenação de 27 anos e 3 meses de prisão, por suposta tentativa de golpe de Estado e outros delitos correlatos, levanta questionamentos severos quanto à coerência decisória e à aplicação isonômica (se é que pode dizer que existe esta igualdade) do Direito.
A defesa de Bolsonaro sustentou de forma veemente que não houve ato direto de comando ou execução que o vinculasse materialmente aos episódios de 8 de janeiro de 2023. O que se apresentou foram inferências baseadas em discursos políticos e no peso simbólico de sua liderança.
Ora, nesta seara do Direito brasileiro exige, para a configuração de crimes de tamanha gravidade, a demonstração clara de vontade (dolo específico) e de participação ativa — requisitos que, sob o prisma técnico, mostraram-se frágeis no conjunto probatório.
Ademais, alegou-se cerceamento de defesa e violação ao devido processo legal, diante da limitação no acesso às provas e da celeridade incomum imposta ao trâmite processual. Não menos relevante, o ministro Luiz Fux apresentou voto divergente, sustentando a absolvição justamente pela insuficiência de elementos aptos a caracterizar o crime de golpe de Estado em sua essência.
A interpretação utilizada pelo STF para a condenação, soa de forma um tanto incongruente, quando analisado ao tratamento dispensado ao ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a disparidade fica definitivamente evidente.
Lula, outrora condenado em segunda instância por corrupção e lavagem de dinheiro, foi posteriormente beneficiado por decisões do próprio Supremo que declararam a incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba e reconheceram nulidades processuais. Tais deliberações anularam condenações e restituíram-lhe a plena elegibilidade, viabilizando sua candidatura presidencial.
É nesse ponto que a crítica se acentua: se para Lula o Supremo reconheceu falhas processuais e anulou decisões, por que a mesma lógica garantista não prevaleceu no caso de Bolsonaro? A igualdade constitucional exige tratamento equânime, e não a seletividade interpretativa.
Assim como no nosso cotidiano, onde a ausência de compliance jurídico expõe empresas a riscos e litígios, no âmbito político a falta de coerência decisória expõe a própria Corte Suprema ao desgaste institucional.
A justiça deve ser cega, às preferências políticas e atenta apenas à solidez das provas e ao rigor da lei.
Conclui-se que, se os mesmos critérios aplicados no caso Lula fossem transpostos ao de Bolsonaro, a decisão mais justa seria a absolvição, pois a insuficiência probatória e as fragilidades procedimentais deveriam conduzir a esse desfecho, e não a uma condenação de caráter vexatória.
“Saudade do tempo que justiça era cega e não careca”.
Everton Alves da Cruz
Empresário, Advogado
especialista em compliance corporativo.